sábado, 5 de janeiro de 2013

Um pouco da história dos samaritanos




Estudando a obra de Flávio Josefo, "História dos Hebreus", chamou-me a atenção este trecho, abaixo reproduzido, que relata um episódio envolvendo judeus e samaritanos, o qual pode nos esclarecer alguns motivos sobre a  inimizade  histórica entre os dois povos. 



O rei Antíoco, recebido na cidade de Jerusalém, a destrói completamente, saqueia o Templo e constrói uma fortaleza.  Abole o culto a Deus. Vários judeus abandonam a religião. Os samaritanos renunciam a sua nacionalidade e consagram o templo de Gerizim a Júpiter grego.

O temor de se meter numa guerra contra os romanos obrigou o rei Antíoco a abandonar a conquista do Egito. Ele veio então com o seu exército a Jerusalém, cento e quarenta e três anos depois que Seleuco e seus sucessores começaram a reinar na Síria. Sem dificuldade, tornou-se senhor dessa praça, porque os de seu partido abriram-lhe as portas, e mandou matar vários do parti­do contrário, apoderou-se de grande quantidade de dinheiro e voltou a Antioquia.

Dois anos depois, no vigésimo quinto dia do mês que os hebreus chamam quisleu, e os macedônios, apeleu, na centésima quinquagésima terceira Olimpí­ada, ele voltou a Jerusalém e não poupou nem mesmo os que o acolheram na esperança de que ele não faria nenhum ato de hostilidade. Sua insaciável avareza fez com que ele não temesse violar-lhes também a fé, despojando o Templo das muitas riquezas de que, sabia ele, estava cheio. Tomou os vasos consagrados a Deus, os candelabros de ouro, a mesa sobre a qual se punham os pães da propo­sição e os turíbulos. Levou até mesmo as tapeçarias de escarlate e de linho fino e pilhou tesouros que estavam escondidos havia muito tempo. Afinal, nada deixou lá. E, para cúmulo da maldade, proibiu aos judeus oferecer a Deus os sacrifícios ordinários, como a sua lei os obrigava.

Depois de saquear toda a cidade, mandou matar uma parte dos habitantes e levou dez mil escravos com suas mulheres e filhos. Mandou queimar os mais belos edifícios, destruiu as muralhas e construiu, na Cidade Baixa, uma fortaleza com grandes torres, as quais dominavam o Templo, e lá colocou uma guarnição de macedônios, entre os quais estavam vários judeus, tão maus e ímpios que não havia males que não infligissem aos habitantes. Mandou também construir um altar no Templo e ordenou que lá se sacrificassem porcos, o que é uma das coisa mais contrárias à nossa religião. Obrigou então os judeus a renunciar o culto ao verdadeiro Deus e a adorar os seus ídolos, e ordenou que se construíssem tem­plos para eles em todas as cidades, determinando que não se passasse um dia sem que lá se imolassem porcos. Proibiu também aos judeus, sob graves penas, circuncidar os filhos, e nomeou fiscais para saber se eles estavam observando as suas determinações e as leis que ele impunha e obrigá-los a isso, caso recusassem obedecer.

A maior parte do povo obedeceu, voluntariamente ou por medo, mas essas ameaças não puderam impedir aos que possuíam virtude e generosidade de observar as leis de seus pais. O cruel príncipe os fazia morrer por meio de vários tormentos. Depois de os mandar retalhar a golpes de chicote, a sua horrível desumanidade não se contentava em fazê-los crucificar, mas, enquanto ainda respiravam, fazia enforcar e estrangular perto deles as suas mulheres e os filhos que haviam sido circuncidados. Mandava queimar todos os livros das Sagradas Escrituras e não poupava ninguém na casa em que os encontrava.

Os samaritanos, vendo os judeus afligidos por tantos males, evitavam dizer que tinham a mesma origem, que eram da mesma raça e que o seu templo em Gerizim era consagrado ao Deus Todo-poderoso. Diziam, ao contrário, que eram descendentes dos persas e dos medos e que tinham sido enviados a Samaria para lá morar; o que era verdade.

Eles enviaram deputados ao rei Antíoco e apresentaram-lhe a seguinte peti­ção: "Petição que os sidônios, habitantes de Siquém, apresentam ao rei Antíoco, deus visível. Nossos antepassados, tendo sido amargurados por grandes e freqüentes pestes, haviam deliberado celebrar, por uma antiga superstição, uma festa à qual os judeus dão o nome de Sabat e construíram sobre o monte Gerizim um templo em honra a um Deus anônimo, onde imolavam vítimas. Agora que vossa majestade se julga obrigado a castigar os judeus como eles merecem, os que executam as vossas ordens querem nos tratar como a eles, porque pensam que temos a mesma origem. Mas é fácil verificar, pelos nossos arquivos, que somos sidônios. Assim, como não podemos duvidar, majestade, de vossa bonda­de e proteção, suplicamos que ordeneis a Apolônio, nosso governador, e a Nicanor, procurador-geral de vossa majestade, que não nos considerem mais culpados dos mesmos crimes que os judeus, cujos costumes e origem diferem inteiramen­te dos nossos. E, se julgarem bem e for do agrado de vossa majestade, seja o nosso templo, que até agora não teve o nome de Deus algum, chamado futura­mente templo do Júpiter grego, a fim de que fiquemos em paz e, trabalhando sem temor, possamos pagar maiores tributos a vossa majestade".

Antíoco, depois de ler a petição, escreveu a Nicanor, nestes termos: "O rei Antíoco a Nicanor. Os sidônios que moram em Siquém nos apresentaram a peti­ção anexa a esta carta. Aqueles que a trouxeram provaram suficientemente, a nós e ao nosso conselho, que eles não têm parte nos crimes e faltas dos judeus, antes desejam viver segundo os costumes gregos. Por isso nós os declaramos inocentes dessa acusação, concedemo-lhes o pedido que nos fizeram — dar ao seu templo o nome de Júpiter grego — e ordenamos o mesmo a Apolônio, seu governador. Dado no ano quarenta e seis e no décimo primeiro dia do mês de Hecatombeom".

Fonte: JOSEFO, Flávio. História dos Hebreus. Rio de Janeiro: CPAD, 2001., 5ª ed., pgs. 286-287


0 comentários:

Postar um comentário