quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Teologia e Pedagogia


por Rousas J. Rushdoony

Para uma filosofia da educação cristã, é básico que o ensino esteja baseado em uma sã teologia e doutrina bíblica do homem. Sendo Cristo o Senhor, o homem não pode sê-lo. A soberania de Deus exclui a soberania do homem. A soberania de Deus significa que nossos critérios educacionais devem derivar da Escritura, não do homem.

Isto significa, primeiro, que em razão de a Escritura deixar claro que o homem é uma criatura caída vivendo em um mundo caído, a educação deve tratar com o fato do pecado. A educação não é evangelismo: é instrução. Em todas as áreas da instrução, as pressuposições se extraem da Escritura, não do homem. Deste modo, na biologia, a base para a teoria da evolução não está na informação biológica, mas no esforço do homem para eliminar Deus do universo. De modo que o que atrai na teoria é religioso, não científico; não explica de maneira satisfatória nada com respeito ao universo, porém satisfaz a hostilidade do humanista para com Deus. Uma filosofia cristã da educação reconhecerá as pressuposições da educação não cristã e se concentrará em desenvolver pressuposições bíblicas como a única base sólida para uma resposta e perspectiva cristãs. Em outras palavras, os homens pensam e agem em termos do que creem; a fé governa a vida, e as pressuposições determinam nossas ciências, artes e filosofia.

Segundo: Isto significa, como se indicou, que existe uma relação necessária entre a fé e o conhecimento. O que sabemos é produto do que cremos. O progresso das ciências no ocidente cristão não é uma casualidade. Somente é possível ciência onde existe a fé em um Deus cujo conselho de predestinação introduz uma lei e uma ordem totais no universo. O relativismo faz com que a ciência seja finalmente impossível; o mesmo sucede com o politeísmo: não pode existir nenhum universo, apenas um 'multiverso' que não tem nenhuma verdade nem significado comum.

Terceiro: Ao ensinar é importante ver, portanto, a unidade do ser do homem. Ele é totalmente uma criatura de Deus, e é uma unidade de fé e ação. A Bíblia fala do coração ou alma do homem como o centro de seu ser, como o núcleo de sua consciência, autoconhecimento e pensamento. Dele emanam os caminhos da vida (PV. 4:23), quer sejam bons ou maus.

O paganismo sustenta uma visão dualista do homem, e algumas vezes, uma visão tripartida. No pensamento grego a mente e o corpo do homem eram duas substâncias distintas e, portanto, alheias uma da outra. Assim, a virtude podia restringir-se a uma esfera. Sócrates poderia seria considerado virtuoso mesmo se fosse homossexual. Deste modo o conflito do homem era metafísico, antes de ser moral.

Como o fundamentalismo possui uma base proveniente das visões dualista e tripartite, é fácil para ele ser antinominiano. A doutrina do “crente carnal”, uma visão extremamente perniciosa, sustenta que o homem pode ser salvo mesmo sem mostrar frutos de justiça ou do Espírito. O espírito do paganismo pode ser resumido no provérbio popular: “Não se pode julgar o coração”. Isto pressupõe que a alma e o corpo do homem são dois ambientes alheios um do outro. Porém, nosso Senhor esclarece que o homem se dá a conhecer e há de ser julgado por seus feitos, assim como uma árvore é conhecida por seus frutos (Mt. 7:16-20). Se não possuirmos uma visão unificada do homem, cairemos com facilidade não só nesta doutrina do “crente carnal” mas também no antinomismo. Este vê na Bíblia dois planos de salvação, um “progresso” do material ao espiritual, e da lei para a graça, embora na Escritura a salvação sempre seja pela graça, sendo o “material” e o “espiritual” realidades igualmente criadas por Deus, ambas caídas, e ambas redimidas, e tanto a lei como a graça são básicas ao ser e ao plano de Deus, de modo que receber a graça é deleitar-se na lei de Deus.

Quarto: Nossa perspectiva deve ser determinada pela teologia, não pela biologia. O homem é produto, não da biologia, mas da palavra criativa de Deus. Isto significa que a determinação teológica é anterior à biologia, e que o determinismo biológico não tem validez.

Assim, a perspectiva moderna encara a adolescência com sua fase tempestuosa, tensa, rebelde e pretensamente independente como realidades biologicamente determinadas e naturais para o homem. Porém, de fato, a adolescência é um produto cultural, a marca distintiva de uma cultura decadente, e é quase desconhecida na história da civilização fora da era moderna. Na maioria das culturas, o que chamamos adolescência é mais um tempo de imitação cuidadosa e atenta dos adultos e da geração mais velha. Os jovens, ingressando na vida madura e no trabalho, estão preocupados em aproximar-se cada vez mais do mundo dos adultos e serem aceitos por eles. Em lugar de rebelar-se contra a geração adulta, os jovens buscam ingressar e se iniciar no mundo dos adultos. Foi somente porque o existencialismo coroou o isolamento e a independência radical que os jovens associam a chegada da maturidade física com uma declaração de guerra e independência. Simplesmente estão representando assim o rito necessário de “confirmação” religiosa do mundo moderno. O jovem cristão é confirmado na fé de seus pais na medida em que se aproxima da maturidade; o rito de confirmação do jovem humanista é a adolescência e sua rebeldia ou existencialismo.

Da mesma forma, uma pesquisa de Edward Shorter indica que a masturbação é, em geral, um fenômeno moderno no homem1. A masturbação é cada vez mais importante na cultura moderna devido ao fato de relacionar-se com o desejo existencial do homem de ser livre de todas as demais pessoas, e deste modo reduzir o sexo a um ato puramente existencialista de uma só pessoa que não necessita de ninguém mais. Na medida em que se diminui o caráter existencialista do homem moderno, assim também sucederá com sua ênfase nos prazeres egocêntricos em todas e cada uma das esferas.

Quinto: A disciplina é fundamental para a educação cristã, porém não se deve confundi-la com castigo. A raiz do termo disciplina é discípulo, e o verdadeiro ensino faz da criança um discípulo feliz e entusiasmado de Cristo, apto para aprender porque ser capaz e estar completamente empenhado no serviço de Deus é um aspecto necessário e honroso da vida em aliança. O castigo é um recurso último, embora necessário. A verdadeira disciplina é positiva; o castigo é negativo. A disciplina estabelece metas, padrões, exigências, provas e medidas. A disciplina cria uma motivação e um relógio internos, de modo que a vida da criança se torna progressivamente uma vida disciplinada, e a disciplina se torna uma parte natural da vida da criança, e isto também de maneira permanente. A disciplina cria uma relação vital entre a fé e os hábitos, de modo que a fé do indivíduo se converte em uma fé disposta e ativa.

Sexto, a educação é, por necessidade, não somente teológica por natureza mas também teocêntrica. Centra-se em Deus porque Deus, como Senhor, requer que todas as coisas o sirvam. O Catecismo Menor de Westminster nos diz que “o fim principal do homem é glorificar a Deus e gozá-lo eternamente”. Todas as áreas da vida e pensamento devem estar alinhadas com este propósito, e especialmente a educação. A educação humanista tem como fim glorificar o homem e capacitá-lo para que desfrute a si mesmo; isso é algo que sempre estará fadado ao fracasso. A educação cristã não pode ser educação secular com um pouquinho de Bíblia. Não se adiciona a Bíblia a um currículo pronto; a Bíblia deve estabelecer, governar e condicionar o currículo, ou não teremos uma educação cristã.

1Edward Shorter: The Making of the Modern Family, pp. 76, 98-102, 106, 114-116, 251. New York, N.Y.: Basic Books, 1975. 

Tradução: Márcio Santana Sobrinho
Fonte: The Philosophy of the Christian Curriculum, p. 162-164.
Publicado em www.monergismo.com


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