Visto ser um assunto que provoca muitas dúvidas e discussões, compartilho também um texto do Dr. Russell Champlin que traz outro ponto de vista sobre o tema.
Jefté
era um homem intenso. Ele vivera temerariamente, matou a muitos e fez
um famoso voto precipitado, que, mui estupidamente, foi cumprido.
Como é óbvio, ele era homem de vontade férrea, embora ele se
tivesse mostrado primitivo em sua fé religiosa. A sua tentativa de
negociar com os amonitas mostra-nos que a violência não era o único
aspecto de seu caráter. Soluções rápidas, por meios violentos,
eram o costume da época, e Jefté foi apenas um produto de sua
época.
O
Problema do Voto. Os intérpretes têm transformado em campo
de batalha essa questão do voto de Jefté. Jefté realmente cumpriu
o seu horrendo voto? Alguns respondem na afirmativa; e outros, na
negativa. Aqueles que respondem com um “não” inspiram-se na
crença dogmática de que isso não pode ter acontecido em Israel,
ou, então, temem que possam compreender que Deus realmente, aprovou
e aceitou o fato.
a)
Argumentos em Apoio que o Sacrifício foi Efetuado. Os textos
bíblicos envolvidos deixam claro que Jefté fez o voto e o cumpriu.
Além disso, porque as mulheres de Israel lamentariam pela filha de
Jefté, se o voto não estivesse cumprido! Apesar dos sacrifícios
humanos terem sido proibidos pela legislação mosaica (ver Dt 18:10;
12:30-31; Lv 18:21; 20:2; Sl 106:37-38; 7:31; Ez 16:20-21), não há
razão alguma para supormos que essas leis foram observadas cem por
cento. Além disso, temos o exemplo de Abraão, no caso de Isaque,
que poderia ter servido de precedente para casos especiais, embora,
via de regra, a legislação mosaica fosse obedecida. Sabemos, por
meio da história, que continuaram em Israel os sacrifícios humanos,
apesar das leis em contrário. Finalmente, os registros bíblicos
mostram que o próprio Jefté foi um homem violento, que, durante
anos, ganhou a vida atacando outras pessoas. Sua primitiva fé
religiosa não o impediu, pois, de oferecer um sacrifício humano, e
o seu passado violento levou-o a aceitar e praticar atos absurdos,
como esse do sacrifício de sua própria filha única. Provavelmente,
ele estava bem convencido de que Deus aprovava o seu voto, o que
estaria evidenciado pelo fato de que derrotara completamente o
inimigo. E, assim sendo, não temeu executar o seu voto, sacrificando
a filha única. Sem dúvida, ele classificava isso como um ato
especial, embora não aprovasse uma prática generalizada de
sacrifícios humanos, de adultos ou de infantes.
b)
Argumentos Contra a Realidade do Sacrifício. O principal
desses argumentos estriba-se sobre a proibição mosaica, supondo que
Jefté não teria ousado contradizê-la. Porém, o argumento da
coerência na observação da lei mosaica não é muito forte. Além
disso, alguns distorcem o próprio texto sobre o voto. O trecho de
Juízes 11.31, então, é interpretado como se dissesse: “...quem
primeiro da porta da minha casa me sair ao encontro, voltando eu
vitorioso dos filhos de Amon, esse será do Senhor, ou (em vez de
e) eu o oferecerei em holocausto”. Mediante essa
sutil alteração imaginária, Jefté teria tido uma opção,
indicando que a pessoa em foco poderia ser consagrada ao serviço do
Senhor, e não como um holocausto que pusesse fim à sua vida
terrena. É verdade que a palavra hebraica envolvida pode ser assim
traduzida, mas o texto inteiro clama contra tal alteração na
tradução. Além disso, o vers. 38, onde as mulheres de Israel
aparecem a lamentar pela virgindade da filha de Jefté, é
interpretado como se indicasse que elas lamentavam não por sua
morte, mas pelo fato de que ela teria de permanecer como virgem,
separada para o serviço do Senhor como tal. A condição normal das
jovens, em Israel, era casarem-se e terem filhos; e, se não fosse
esse o caso, então fazia-se lamentação pela donzela. Porém, a
virgindade da filha de Jefté foi lamentada, não porque ela tivesse
permanecido no celibato pelo resto da vida, e, sim, porque seria
morta quando ainda virgem, pelo que não tivera tido oportunidade de
ter filhos, o que era considerado uma desgraça em Israel. Outrossim,
sendo ela morta, isso significaria que Jefté não teria quem lhe
continuasse o nome, visto que ela era sua filha única. E isso também
era considerado uma calamidade em Israel.
Comentário
sobre o Voto de Jefté. Que o
voto de Jefté foi cumprido, tenhamos a certeza. Isso é apenas uma
evidência da natureza primitiva da fé de um homem violento. Não há
razão para supormos que Deus tenha dado a Jefté a sua notável
vitória porque ele fizera aquele voto, ou que, depois da vitória,
houvesse qualquer necessidade de cumprir o voto. Jefté é que criara
a situação toda. Deus
não esteve envolvido em tão estúpido ato.
As pessoas acusam Deus de toda espécie de coisas ridículas, e até
mesmo injuriosas e prejudiciais, e inventam coisas estúpidas em suas
mentes. O trecho de Juízes 11:29 mostra-nos que Deus usa as pessoas
até mesmo quando elas pensam e agem de forma estúpida.
CHAMPLIN,
Russell Norman. Enciclopédia
de Bíblia, Teologia e Filosofia.
São
Paulo: Hagnos, 2002, volume 3.
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