Até que ponto vai a nossa dedicação no discipulado individual? Até onde estamos dispostos a ir para resgatar o perdido? A história abaixo nos leva a refletir sobre estas questões. Que o Senhor Jesus acenda em nós paixão pelos perdidos...
"A primeira perseguição cessou durante o reinado de Vespasiano que permitiu algum descanso aos pobres cristãos. Depois dele, logo veio a segunda perseguição desencadeada pelo imperador Domiciano, irmão de Tito. Agindo no início de forma branda e moderada, ele em seguida cometeu um ultraje tão grande em seu insuportável orgulho que ordenou a adoração de si mesmo como deus e mandou que em sua honra imagens de ouro e prata fossem erigidas no capitólio.
"A primeira perseguição cessou durante o reinado de Vespasiano que permitiu algum descanso aos pobres cristãos. Depois dele, logo veio a segunda perseguição desencadeada pelo imperador Domiciano, irmão de Tito. Agindo no início de forma branda e moderada, ele em seguida cometeu um ultraje tão grande em seu insuportável orgulho que ordenou a adoração de si mesmo como deus e mandou que em sua honra imagens de ouro e prata fossem erigidas no capitólio.
Nessa
perseguição, João, o apóstolo e evangelista, foi exilado por
Domiciano para a ilha de Patmos. Depois que o imperador morreu
assassinado e o senado revogou as suas leis, João foi posto em
liberdade e no ano 97 veio para Éfeso, onde permaneceu até o
reinado de Trajano. Ali dirigiu as igrejas da Ásia e escreveu o seu
evangelho. E assim viveu ele até o ano 68 depois da paixão de nosso
Senhor, quando a sua idade era de aproximadamente cem anos.
Clemente
de Alexandria acrescenta uma certa história relativa ao santo
apóstolo, que merece ser lembrada por aqueles que têm prazer nas
coisas honestas e proveitosas. A história é a seguinte: Quando
João voltou para Éfeso procedente da ilha de Patmos,
solicitaram-lhe que visitasse os lugares nas redondezas. Quando, ao
fazê-lo, chegara a uma certa cidade e havia confortado os irmãos,
viu um jovem de corpo robusto, belo semblante e espírito ardente.
Fixando sério o recém- indicado bispo, disse João: — Eu, da
maneira mais solene, entrego este homem em tuas mãos, aqui na
presença de Cristo e da Igreja.
Quando
o bispo havia recebido de João essa responsabilidade e havia
prometido agir com fidelidade e diligência em relação a ela, João
novamente dirigiu-lhe a palavra e lhe confiou a responsabilidade como
antes fizera. Feito isso, João voltou para Éfeso. O bispo,
recebendo o jovem entregue aos seus cuidados, trouxe-o para casa,
cuidou dele, alimentou-o e finalmente o batizou. Depois disso, ele
gradativamente relaxou sua atenção e vigilância sobre o jovem,
confiando que já lhe dera as melhores salvaguardas possíveis ao
marcá-lo com o selo do Senhor.
O
jovem tinha então mais liberdade, e aconteceu que alguns de seus
velhos amigos e conhecidos, que eram ociosos, dissolutos e
endurecidos na maldade, passaram a fazer-lhe companhia. Inicialmente
o convidaram para suntuosos e libertinos banquetes; depois o
convenceram a sair com eles pela noite para furtar e roubar; em
seguida, eles o tentaram a cometer maiores males e maldades. Assim,
com o tempo veio o costume e pouco a pouco o jovem se tornou mais
habilidoso e, sendo muito inteligente e de intrépida coragem, como
um cavalo bravio ou indomado, abandonando o caminho reto e correndo
solto e sem peias, foi levado de cabeça para as profundezas da
desordem e do ultraje. E assim, esquecendo-se por completo da salutar
doutrina da salvação que antes aprendera a ponto de rejeitá-la,
foi tão longe no caminho da perdição que para ele avançar muito
mais não era motivo de ansiedade. Desse modo, juntando-se a um bando
de companheiros e colegas ladrões, ele assumiu o papel de cabeça e
capitão entre os colegas, na perpetração de todos os tipos de
assassínios e felonias.
Aconteceu
que João foi novamente solicitado a visitar aquela região. Veio e,
ao encontrar-se com o bispo a quem nos referimos antes, cobrou dele
que prestasse contas do compromisso assumido na presença de Cristo e
da congregação que estivera presente na ocasião. O bispo, algo
surpreso com as palavras de João, supondo que se referissem a algum
dinheiro posto sob sua custódia e que ele não recebera (mas mesmo
assim não ousava desconfiar de João nem contrariar-lhe as
palavras), não sabia o que responder. Então João, percebendo a sua
perplexidade, expressando o que queria dizer de modo mais claro,
explicou: — O jovem e a alma do nosso irmão posta sob a sua
custódia, eu os exijo. — Então o bispo, lamentando e chorando em
altos brados, disse: — Ele morreu. — E João indagou: — Como,
qual foi a causa da morte? — Disse o outro: — Ele morreu para
Deus, pois se tornou um homem mau e desregrado e acabou como um
ladrão. Agora frequenta a montanha em vez da Igreja, na companhia de
malfeitores e ladrões iguais a ele.
Nesse
ponto o apóstolo rasgou suas vestes e, lamentando muito, disse: —
Que belo guardião da alma de seu irmão deixei aqui! Arranje-me um
cavalo e arrume um guia que me acompanhe. — Feito isso,
providenciados o cavalo e o homem, ele saiu às pressas da Igreja.
Chegando ao lugar indicado, foi preso por ladrões que estavam à
espreita. Mas ele, sem tentar fugir ou resistir, disse: — Vim até
aqui com uma finalidade. Levem-me — disse ele — ao seu capitão.
Assim que se cumpriu o seu pedido, o capitão, armado até os dentes,
começou a examiná-lo de modo impiedoso. Logo em seguida, ao
reconhecê-lo, foi tomado de confusão e vergonha e empreendeu uma
fuga. Mas o velho o seguiu como pôde e, esquecendo-se da idade,
gritava: —Meu filho, por que foges de teu pai? Um homem armado
fugindo de um homem despojado, um jovem fugindo de um velho? Tem
piedade de mim, meu filho, e não tenhas medo, pois ainda resta
esperança de salvação. Eu responderei a Cristo por ti. Eu morrerei
por ti, se for preciso. Como Cristo morreu por nós, eu darei a minha
vida por ti. Acredita-me, foi Cristo que me enviou.
O
capitão, ouvindo tais palavras, primeiro, como se estivesse confuso,
ficou estático, e com isso a sua coragem se abateu. Depois jogou as
armas ao chão e aos poucos começou a tremer, sim, e depois chorou
amargamente. Em seguida, aproximando-se do velho, abraçou-o e falou
com ele chorando (da melhor maneira que pôde), sendo novamente
batizado no ato com lágrimas. Mas escondia a mão direita que estava
encoberta.
Em
seguida o apóstolo, depois de prometer que obteria o perdão de
nosso Salvador, orou, caindo de joelhos, e beijou-lhe a mão direita
assassina (que por vergonha ele antes não ousava mostrar), agora
purificada pelo arrependimento, e o trouxe de volta para a Igreja. E
quando havia rogado por ele com oração contínua e jejuns diários,
e o havia fortalecido e confirmado a sua mente com muitas máximas,
João o deixou novamente restaurado para a Igreja. Um grande exemplo
de sincera penitência, prova de regeneração e um troféu da futura
ressurreição."
(FOXE,
John. O
livro dos Mártires.
São Paulo: Mundo Cristão, 2003, pgs. 22-24)
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