[Santo Agostinho]
“Considerando também a
vontade, que nos leva a crer e se atribui ao dom de Deus, porque
nasce da liberdade e a recebemos na criação, reflita e perceba o
contraditor que não somente se deve atribuir esta vontade à graça
divina, porque procede da liberdade inserida em nós pela natureza
desde a criação, mas também porque Deus age mediante meios
suasórios visíveis para nos levar a querer e a crer. Esta atuação
divina pode se dar ou exteriormente por meio de exortações
evangélicas, com alguma influência dos preceitos da lei, se levam o
homem à consciência de sua fragilidade e a se refugiar pela fé na
graça que justifica, ou interiormente, onde ninguém pode provocar
nenhum pensamento, mas é iniciativa da vontade consentir ou
dissentir. Portanto, quando Deus concorre com a alma racional
mediante estes meios – e ninguém pode crer em algo apenas com o
uso da liberdade sem a influência de uma persuasão ou chamado em
relação em quem deve crer -, não há dúvida de que ele opera no
homem o próprio querer e sua misericórdia nos precede em tudo. Mas
o consentimento ou o dissentimento ao chamado de Deus, conforme já
afirmei, é obra da vontade própria. Esse ensinamento não somente
desvaloriza o que está escrito: Que é que possuis que não
tenhas recebido?, mas o confirma. Pois a alma não tem capacidade
de receber e conservar os dons, aos quais se refere a sentença, a
não ser consentindo. Por isso, o que tem e o que recebe vem de Deus,
mas o receber e o conservar dependem de quem recebe e possui.”
Santo
Agostinho, in FERREIRA, Franklin. Agostinho de A a Z.
São Paulo: Editora Vida, 2006. Série Pensadores Cristãos.
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